O presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto que cria a
Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão que vai fiscalizar o
cumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
O decreto, publicado no Diário Oficial da União desta quinta-feira (27), aprova
a estrutura de cargos e define as funções da ANPD. O órgão terá a tarefa de
regular a lei, observando a aplicação correta dos artigos previstos na LGPD e
definindo as eventuais punições em caso de descumprimento. A autoridade também
terá a função educativa de orientar a sociedade sobre as novas normas e mediar
eventuais conflitos entre as empresas e os clientes.
A criação da ANPD acontece em meio a cobranças de entidades setoriais,
advogados e da iniciativa privada, que defendiam que a entrada da LGPD em
vigor, sem uma autoridade fiscalizadora, geraria insegurança jurídica,
sobretudo pelo fato de que a lei que traz conceitos inéditos em relação à
proteção de dados e privacidade na internet.
A autoridade ficará sob responsabilidade da Casa Civil e o ministro da pasta
fará a indicação do conselho diretor da autoridade, que será composto por cinco
membros, nomeados pelo presidente.
Lei entra em vigor em 15 dias, após Bolsonaro receber PLV
Uma manobra regimental usada nesta quarta-feira (27) pelo
presidente do Senado, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), gerou confusão sobre o
início da vigência da LGPD. Porém, conforme explica Thiago Sombra, sócio de
tecnologia do Mattos Filho, a nova lei entrará em vigor dentro do prazo máximo
de 15 dias, contados a partir da data em que a Presidência receber o texto que
saiu da Casa para sanção do presidente.
Ontem, o Senado transformou a Medida Provisória (MP) nº 959/2020 – que, entre
outros pontos, tratava do prazo de vigência da LGPD -, no Projeto de Lei de
Conversão (PLV) 34/2020. O PLV foi aprovado pelos senadores e segue para sanção
presidencial.
Mas Davi Alcolumbre considerou “prejudicado” o artigo 4º do texto, que visava
adiar o início da vigência da nova lei de proteção de dados para o começo do
ano que vem.
Sombra explica que o fato de o artigo ter sido considerado “prejudicado”, e não
simplesmente rejeitado, significa ele segue valendo até a sanção ou veto do PLV
pelo presidente Jair Bolsonaro. “Foi uma manobra regimental do Alcolumbre,
porque se ele rejeitasse formalmente o artigo, ele teria que devolver o texto
para a Câmara”, diz o sócio do Mattos Filho.
Com o artigo da MP ainda valendo, por enquanto o adiamento da LGPD para o
início do ano que vem está mantido. Porém, como a prorrogação não faz mais parte
do texto encaminhado ao presidente, seja qual for a decisão, o adiamento deixou
de existir. “O que foi para o presidente não prevê adiamento, então ele não tem
como sancionar esse ponto, é um vácuo jurídico”, afirma o advogado.
O presidente tem até 15 dias para apreciar o PLV. Assim que ele vetar ou
sancionar o texto, a MP perde validade imediatamente e passa a prevalecer o
texto original da LGPD, que previa a entrada em vigor da lei no dia 14 de
agosto passado.
Com o presidente sancionando antes desse prazo ou não, fato é que o adiamento
não está mais em questão e a LGPD inevitavelmente passa a vigorar no máximo em
até 15 dias.
O presidente também não poderia criar uma nova Medida Provisória estipulando um
novo adiamento da LGPD, porque como a questão já foi apreciada pela Câmara e
pelo Senado, poderia incorrer em crime de responsabilidade, segundo Sombra.
Empresas devem se adequar desde já
A aplicação de sanções da LGPD somente será possível a partir de agosto de 2021, no entanto é possível que autoridades de defesa do consumidor tentem realizar, com amparo no Código de Defesa do Consumidor (CDC), uma aplicação paralela dos direitos dos titulares, previstos na nova lei. Ou seja, com a lei em vigor fica mais claro para a sociedade e para entidades de defesa quais são os direitos dos titulares de dados, isso pode abrir brecha para mais processos judiciais.
“Entendo não ser coerente por parte do Governo a exigência para a adequação das empresas, quando nem ele mesmo cumpriu o seu papel de constituição do órgão que fiscalizará e, em especial, elaborará as diretrizes para a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade (art. 55-J, III, da LGPD)”, afirmou Eduardo Silveira, advogado da área de proteção de dados e privacidade do escritório Duarte e Tonetti Advogados, que está acompanhando a questão em Brasília e se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos.
Silveira complementou que o Decreto 10.474, publicado nesta quinta, define a estrutura regimental e o quadro de cargos da ANPD – Autoridade Nacional de Proteção de Dados. “Todavia, a criação da estrutura regimental da ANPD é apenas o primeiro passo. Os membros do Conselho Diretor devem passar por sabatina no Senado, assim como ocorre com integrantes de agências reguladoras.”